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A rejeição social vem se tornando cada vez mais evidente na sociedade brasileira, principalmente nos últimos anos, quando passaram a ser frequentes, por parte de políticos, palavras depreciativas e discriminatórias contra grupos sociais de indígenas, quilombolas, caboclos, negros, comunidade LGBTQ+, pobres, favelados etc. Essa discriminação, não só contraria os princípios de igualdade perante a lei, previstos na Constituição Federal de 1988, como também vai contra os preceitos de diferentes religiões, no que tange ao respeito ao próximo.
Nesse sentido, quando um discurso promove a exclusão social e destila o ódio contra grupos sociais, também está incentivando a perseguição e a violência contra esses grupos, que geralmente são minoritários. São grupos que fazem parte da sociedade e têm um papel significativo na diversidade cultural e na construção de um país com dimensões continentais como é o Brasil.
Conexão social e sobrevivência
A conexão social faz parte da vida humana, e se consolidou no processo evolutivo do homo sapiens, no enfrentamento de diferentes desafios e adversidades, relacionados com a sobrevivência. Dentre estes desafios estão as mudanças drásticas no clima, enfrentamento de fenômenos naturais e intempéries, contato com animais perigosos e predadores, caça para alimentação, defesa dos inimigos, necessidade de trabalho coletivo para grandes empreendimentos que requerem aumento da força física, apoio mútuo afetivo nos sofrimentos e estratégias para reprodução. Por isso, historicamente, o ser humano desenvolveu necessidades básicas sociais para poder sobreviver com os outros, o que permanece ativo até os dias atuais para quem vive em sociedade.
O coordenador do Laboratório de Neurociência Cognitiva e Social da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o neurocientista Paulo Sérgio Boggio, diz que as necessidades básicas sociais estão relacionadas ao pertencimento a um grupo social, à autoestima, ao controle em relação à própria vida, e ao significado da existência. Quando tais necessidades são negadas ao indivíduo, a conexão social entra em desequilíbrio. É quando as pessoas que sofrem a ruptura social têm intensificadas experiências emocionais negativas, advindas do sofrimento de terem sido excluídas socialmente, sentindo aumento da raiva, da tristeza e do ressentimento.
Exclusão social e dor
A neurociência vem trazendo importantes contribuições para compreendermos como a exclusão social é processada no cérebro do ser humano. No ano de 2003, Naomi I. Eisenberger e Matthew D. Lieberman, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles (EUA), juntamente com Kipling D. Williams, da Universidade de Sydney, na Austrália, publicaram um estudo, relacionando a exclusão social com a dor física. O estudo consistiu num experimento com uso de tecnologia de imagem cerebral, para identificar as áreas ativadas em situação de exclusão social, durante um jogo realizado em ambiente de laboratório (CyberBal). O artigo foi publicado na revista científica Science (vol. 302) com o título “Does Rejection hurt? An fMRI study of social exclusion” (A rejeição machuca? Um estudo da exclusão social com ressonância magnética funcional fMRI).
Para tal, os pesquisadores propuseram a um grupo de voluntários realizar o CyberBal pelo computador, enquanto faziam o escaneamento cerebral. O jogo consistia em jogar uma bolinha entre três pessoas, sendo que aquela que estava realizando o escaneamento cerebral, era excluída na programação do computador, explícito ou implicitamente. Isto quer dizer que a bolinha na tela não era atirada para ela, ou atirada raramente, como sendo uma forma sutil dela se sentir excluída socialmente do grupo dos outros dois jogadores virtuais. Depois do jogo, os voluntários respondiam a um questionário, abordando como se sentiram durante aquela experiência.
Na análise dos dados das imagens e dos questionários, os pesquisadores constataram que a angústia da rejeição social de não poder jogar havia provocado um aumento da atividade em duas áreas cerebrais. Uma delas é a área cerebral envolvida no sistema de alarme, que detecta a dor e a ruptura afetiva em situação de conflito (área anterior do córtex cingulado); a outra área é a que faz a regulação e promove a diminuição da dor (córtex pré-frontal ventral direito). Nesse experimento, ficou evidenciado que a dor da exclusão social ativa as mesmas áreas cerebrais que estão envolvidas na dor física, o que faz com que a rejeição social provoque uma dor que é real e verdadeira.
Ruptura na conexão social
A dor faz parte do sistema de alarme do corpo, que informa que algo que a pessoa está vivenciando no momento não está funcionando adequadamente, o que pode ser no seu corpo, ou no ambiente em que se encontra. Em experimentos com ratos de laboratório, foi constatado que as áreas cerebrais envolvidas na dor são as mesmas relacionadas com a conexão entre mãe e filho. Por isso, diante da separação materna, o filhote chora, ativando a área de processamento da dor no seu cérebro, ao mesmo tempo em que seu choro ativa a mesma área cerebral da mãe, que ouve o choro e socorre a cria. Nesse sentido, a dor da separação afetiva se constitui numa dor decorrente da falta de conexão social, que coloca o animal diante da ameaça contra a própria sobrevivência.
A ciência já vem constatando que ser ignorado ou ser excluído do grupo leva as pessoas a sentir um sofrimento real de dor. Por isso, quem exclui e discrimina o outro, precisa saber que a dor alheia da exclusão é uma dor real e que esse sofrimento pode, inclusive, levar ao adoecimento físico e mental, quando as situações de exclusão são intensas e repetidas. Nesse sentido, os avanços científicos ajudam a compreender que promover a exclusão social e a discriminação é algo perverso e provoca tanta dor como é uma agressão física, punida pela lei.
Os excluídos na educação brasileira
Na última quinta-feira, dia 24 de setembro, o Ministro da Educação e pastor presbiteriano Milton Ribeiro, em entrevista ao jornal “O Estado de São Paulo”, atribuiu que a homossexualidade se deve à “falta de atenção do pai, falta de atenção da mãe”, no contexto de “famílias desajustadas”. Não mencionou que evidências científicas tem para fazer essa afirmação, generalizando um dado que discrimina as famílias de um modo geral, e pessoas com diferentes identidades sexuais. Com relação ao problema da falta de internet dos alunos mais pobres, que não estão conseguindo acompanhar as aulas em ambiente remoto em casa, o ministro disse que “não é atribuição” do Ministério da Educação resolver um problema, que é abrangente e que antecede o governo atual.
Pelo que se constata nesse discurso de exclusão, a negação da ciência continua sendo um entrave no governo e na formulação de políticas públicas inclusivas. Enquanto opiniões “desajustadas” acerca dos problemas da população promovem e aumentam a exclusão social e a discriminação, os princípios democráticos do país correm o risco de serem enfraquecidos. Assim, pessoas mais pobres e de grupos minoritários vão sendo deixadas para trás, cada vez mais separadas das sociedades, sem que seus direitos constitucionais sejam garantidos.
Num momento tão desafiador como o da pandemia do novo coronavírus, vários grupos sociais estão realizando ações que visam minimizar as diferenças no acesso a alimentos, a produtos de higiene, a oportunidades de trabalho, educação etc., apoiando os que sofrem da dor da exclusão social. Essa é uma forma de minimizar uma dor real que as pessoas excluídas sentem em aspectos básicos de sua sobrevivência. Essa dor da conexão social também precisa ser reconhecida pela sociedade e por aqueles que governam o país. Isso é fundamental para a promoção do crescimento de uma nação que possui ampla diversidade de cor, raças, culturas etc. Assim, será possível garantir a justiça social e os direitos de todos, conforme o que está previsto na Constituição Federal de nosso país.
A imagem de destaque deste artigo mostra homem em condição de vulnerabilidade social (Foto: Maria Rita Teixeira)
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