Tensão domina a rotina de médicos e enfermeiros em todo o Brasil - Ecoo

Tensão domina a rotina de médicos e enfermeiros em todo o Brasil

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Medo, insegurança, exaustão e tensão são as palavras mais usadas por aqueles que se equipam com máscaras, óculos e aventais para enfrentar algo invisível, mas com potencial letal. Muitos chegam a passar até 12 horas sem comer, beber água e ir ao banheiro justamente para não ter que tirar toda a vestimenta especial.

“O principal risco [de contaminação] é na desparamentação, ou seja, a gente colocou os EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), atendeu o paciente com a infecção e, na hora que a gente vai tirar esses EPIs, às vezes, tem contato com a mucosa da boca ou com olho e é nesse momento que a gente tem o risco de contaminação”, explica o médico clínico geral Pedro Carvalho Diniz.

“Então, muitos profissionais, como é o meu caso, acabam optando por ficar mais tempo com os EPIs para não aumentar o número de desparamentação e, portanto, não aumentar o risco de infecção.”

Crédito: Arquivo pessoalEquipamentos especiais para entrar na UTI Covid-19

Diniz atua no Hospital Universitário Federal da Universidade Federal do Vale do São Francisco (HU-Univasf), em Petrolina, no sertão de Pernambuco. Por lá, ainda não há carência da maioria dos EPIs, mas a máscara N95 já está prestes a acabar. “Se a coisa apertar não chega a um mês”, diz o médico.

Em muitos outros hospitais de todo país, há relatos da falta de equipamentos de proteção para médicos e enfermeiros. Faltam até mesmo os mais básicos, como aventais, luvas e álcool gel.

Até o último dia 6, a Associação Médica Brasileira (AMB) já havia recebido 2.868 denúncias de profissionais de saúde que se sentem ainda mais vulneráveis à contaminação.

“A saúde mental é um grande desafio”, diz Diniz. “É um plantão muito diferente do que os que a gente tinha. Eu já fiz alguns muitos procedimentos de intubação orotraqueal, para conectar o paciente ao respirador, mas dado o risco da infecção, a gente toma alguns cuidados a mais e isso deixa a gente muito tenso”, conta o médico que também observa a mesma tensão nos colegas.

“O telefone da UTI toca e a equipe fica apreensiva para saber se é alguém pedindo vaga para um paciente com covid, porque o risco de contágio é muito grande.”

Por passar por muito tempo do turno com os equipamentos de proteção, Diniz já está com o rosto marcado. Além disso, ele conta que, depois de várias horas, a vestimenta começa a pesar e limitar os movimentos. “Então, ao final do plantão, a gente está muito mais cansado que ao final de um plantão normal”, diz.

Vida fora do hospital

O medo tão comum entre esses profissionais não se delimita às salas de UTI e aos muros dos hospitais. Ele os acompanha na ida ao trabalho e na volta para casa diariamente e vai aumentando à medida que a pandemia avança.

“A volta pra casa está muito difícil”, diz a enfermeira intensivista Karine Góes, que mora no Irajá, na zona norte do Rio de Janeiro, e trabalha em um hospital privado na Barra da Tijuca, na zona oeste.

Para chegar até lá, ela pega dois ônibus e um metrô. É quando o distanciamento social torna-se impossível de acontecer. “Diminuíram as conduções, e as pessoas infelizmente não estão respeitando o certo, os ônibus só deveriam sair sem passageiros aglomerados em pé, mas isso aqui no Rio não existe. A última condução que pego, é um ônibus pequeno, que só tem saído lotado do ponto final”, conta.

enfermeira

Crédito: Arquivo pessoalKarine relata dias estressantes e tumultuados no hospital

Karine mora com o padrinho e, desde que começou a cuidar de pacientes com covid-19, passou a evitar contato com ele e com o restante da família. Ela procura ficar isolada em seu quarto, além de tomar todos os cuidados ao chegar em casa.

“Deixo meus sapatos e mochila na área, já coloco todas as minhas roupas para ser lavadas, já separamos talheres, copos, pratos, tenho lavado minhas louças separadamente. Quando utilizo banheiro, ou outras coisas de uso comum, fazemos a higienização depois com álcool gel ou água sanitária.”

post no facebook de enfermeira

Esses cuidados são comuns entre aqueles que trabalham em contato direto com o vírus. Para preservar a família do risco de se contaminar, o médico Pedro Diniz se mudou para a casa de um amigo.

“Eu tenho dois filhos pequenos, um de 4 anos e outro de 5 meses, e para protegê-los estou evitando contato com eles há praticamente uma semana. Eu estou ficando na casa de um amigo que mora sozinho, que tem um chuveiro do lado de fora, no quintal, então, eu tomo um banho lá e estou pernoitando na casa dele.”


Risco real

A enfermeira Karine Góes também conta que os dias têm sido muito estressantes no hospital. “Alguns amigos meus começaram a apresentar sintomas da covid-19, alguns foram afastados e conheço alguns que estão indo trabalhar normalmente, nenhum positivado ainda porque não estão sendo feito os testes em pessoas que não apresentam sintomas graves”, diz.

Ainda não há dados concretos sobre o número geral de profissionais da linha de frente contaminados no Brasil, porém sabe-se que o risco de contaminação é alto e inúmeros hospitais já precisaram afastar não só médicos e enfermeiros, como também equipe da limpeza, recepção e manutenção.

Na cidade de São Paulo, a mais afetada pelo vírus, o hospital Sírio Libanês mandou 104 funcionários para casa no final de março. O Albert Einstein, também na capital paulista, afastou outros 348.

Embora exauridos pela pandemia, enfrentando medos e tendo que fazer renúncias emocionais para preservar a saúde de familiares, a única coisa que não passa pela cabeça desses profissionais é abandonar as trincheiras do combate ao coronavírus.

“Tenho consciência do meu trabalho e sei que indo trabalhar, estou ajudando alguém que precisa dos meus cuidados. E isso me conforta”, diz Karine.


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