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No último sábado, 12, viralizou um vídeo da cantora e pastora, Ana Paula Valadão, no Congresso Diante do Trono 2016, dizendo que “a AIDS está aí para mostrar que a união sexual entre dois homens causa uma enfermidade que leva à morte”.
Além disso, outra fala homofóbica de Ana chamou atenção. “A Bíblia chama qualquer escolha contrária a que Deus determinou como ideal, como ele nos criou para ser, de pecado”, disse a pastora evangélica.
Pois bem, vamos começar falando que o vírus do HIV não infecta apenas pessoas da comunidade LGBTQIA+, todas pessoas estão propensas à infecção, independentemente se ela é gay, bissexual, heterossexual, pansexual ou qualquer outra orientação sexual e identidade de gênero.
Mas de onde vem esse pensamento retrógrado de Ana Paula Valadão? Isso está intrínseco à sociedade, porque desde o início da epidemia da HIV, na década de 80, o acometimento desproporcional está ligado à comunidade LGBTQIA+.
Rico Vasconcelos, médico infectologista da Faculdade de Medicina da USP, diz que existem vários fatores que determinam essa maior concentração do HIV da população LGBTQIA+. “Dentre eles os fatores individuais, o tipo de sexo que a pessoa faz. No contexto de vida sexual, a população gay é muito menor que a população geral. O fato dessas pessoas transarem entre si faz com que doenças sexualmente transmissíveis façam esse ciclo de maneira muito mais rápida”, diz.
Mas, é necessário ressaltar que questões sociais estão extremamente atreladas a este aspecto, fazendo que a LGBTfobia e a discriminação em geral dificultem o acesso à saúde dessa população. “Existem as questões que a gente chama de programáticas, que tem a ver com o que foi feito pelos órgãos públicos de saúde, para tentar controlar a disseminação dessa epidemia em determinados grupos”, comenta o infectologista.
Segundo Rico, não houve esse prática de controle da transmissão do HIV na população LGBTQIA+ nas últimas décadas. “O fato de certa forma dessa negligência do poder público no controle dessa disseminação é também um fato que proporciona, amplifica o crescimento da epidemia nesses grupos”, diz. “A gente não considera que culpa seja dos LGBTQIA+, eles são vítimas, principalmente da exclusão social”, complementa.
Existe um grupo chamado “círculo de exclusão”, em que estão presentes trabalhadores do sexo, dependentes químicos, pessoas privadas de liberdade, refugiados, população negra, todos que são deixados à margem da sociedade automaticamente são mais vulneráveis à epidemia de doenças transmissíveis.
De acordo com o Doutor Rico Vasconcelos, “isso faz com que tenha hoje uma prevalência de infecção na população de homens gays e bissexuais de 18%, enquanto na população geral gira em torno 0,4%”. E ele ainda complementa: “Na população transsexual encontra-se a prevalência muito mais alta, chegando a 30% a 40%. E isso faz até hoje que as pessoas tenham impressão de que HIV é coisa de gay e trans”.
Ainda na década de 80 existia um cuidado dos epidemiologistas em apontar esta maior concentração na população LGBTQIA+, a maior vulnerabilidade que esses grupos populacionais tinham em relação a essa epidemia. “Isso lá foi criado, que hoje já é ultrapassado, os tais de grupos de risco. O conceito de grupo de risco tinha como objetivo alertar e proteger aqueles grupos”, explica o médico.
Mas, parece que não deu muito certo. Ao invés de proteger e alertar, acabou estigmatizando, criou-se um equívoco na cabeça das pessoas que perdura até os dias de hoje sobre a transmissão do vírus HIV. Isso faz com que muitas pessoas pensem que por não estarem no “grupo de risco” (citados acima), não precisam se preocupar com a infecção do vírus.
Rico conta que as as consequências dessa abordagem dos anos 80 e 90 foi catastrófica e até hoje enfrenta-se os ecos desse estigma. “Pouco tempo depois tentou-se corrigir esse erro feito de grupo de risco, tentando criar a ideia de comportamento de risco. Tentou tirar o peso do grupo e passou a colocar o peso em cima do comportamento da pessoa praticava”, comenta.
De acordo com Vasconcelos, no começo a ideia era boa, mas não conseguiu resolver e até piorou a situação porque o conceito de comportamento de risco acabou colocando na cabeça das pessoas a ideia de culpa, como se uma pessoa que pegasse HIV tivesse contraído o vírus porque sabia o que não era pra ser feito – como, por exemplo, transar sem camisinha.
“Isso é uma coisa que a gente tem muito forte no senso comum em relação a doenças sexualmente transmissíveis. Como se uma pessoa pegasse porque ela fez o que não devia. Se ela não tivesse feito aquilo, ela não teria pego. Há quem diga: ‘Se ela não fosse gay, se ela não tivesse transado com uma garota de programa, se ela não usasse droga, ela não ia pegar’.” diz.
“O que é um grande equívoco porque nem sempre uma pessoa escolhe transar sem camisinha. Muitas vezes o contexto de vida dela faz com que a negociação do uso de preservativo seja algo difícil, muitas vezes existe violência envolvida na relação, que impossibilita o uso do preservativo. Muitas vezes a pessoa não tem acesso ao uso do preservativo. Muitas vezes a pessoa não tem o empoderamento e ir até o posto pegar camisinha”, afirma.
Hoje não são mais utilizados os termos “grupo de risco” e nem “comportamento de risco”. Especialistas e pesquisadores da área preferem utilizar o conceito de vulnerabilidade, que considera que todas pessoas do mundo tenham um vulnerabilidade, e sim, podem ser infectadas pelo HIV. “Qualquer pessoa que transa está vulnerável ao HIV, e essa vulnerabilidade por ser aumentada ou diminuída, de acordo com uma série de fatores, aqueles fatores individuais e programáticos que muitas vezes não dependem deles”, afirma o especialista.
Em um contexto geral, se uma pessoa pensa que um menino gay se infecta com o vírus do HIV porque transa sem camisinha, é necessário entender os fatores que levam ele a fazer isso. Todavia, o sexo casual praticado pelo menino gay é idêntico ao jovem heterossexual que também faz sem camisinha. Contudo, por ser gay, ele se encontra mais vulnerável a ter HIV por fatores que não dependem dele próprio.
“Simplificar demais essa questão, dizendo que HIV é coisa de LGBT é a pior coisa a ser feita. Aliás, no HIV, sempre que você simplifica demais a questão, você erra!”, disse Rico Vasconcelos.
Mitos sobre HIV
Conversando com Rico Vasconcelos também aproveitamos para desmitificar mitos sobre o vírus. Abaixo alguns deles:
1 – Não, HIV não é a mesma coisa que AIDS. “As pessoas se confundem porque na época de 80, quando ainda não existia o tratamento, HIV era sinônimo de AIDS. Não havia como impedir que alguém que se infectava com esse vírus, desenvolvesse mais cedo ou mais tarde, a doença AIDS. Hoje em dia que a gente tem o tratamento antirretroviral, não são mais similares. É perfeitamente possível se infectar com HIV, fazer o tratamento e ser ao longo da sua vida uma pessoa saudável que vive com HIV”.
2 – HIV é coisa de gay? “Não é! Inclusive, em números absolutos, os números de héteros que se infectam por HIV é muito próximo do numero de gays. A população LGBTQIA+ é muito menor do que a população hétero, que é a grande maioria da sociedade atual.
3 – Diferentes práticas sexuais transmitem da mesma forma? “Sexo oral transmite, se é que transmite, muito menos HIV do que sexo com penetração. Sexo anal transmite muito mais que sexo vaginal.”
4- Pessoas com HIV não podem transar sem camisinha, não podem ter filhos? “Eles podem, a gente sabe hoje que uma pessoa que vive com HIV e está tratamento antirretroviral e com a carga viral indetectável, essa pessoa é alguém que não traz risco de transmissão por via sexual, mesmo que sem preservativo, então é perfeitamente seguro transar com uma pessoa com HIV que está sob tratamento adequado.
PrEP
Profilaxia Pré-Exposição é uma nova estratégia de prevenção de HIV que consiste no uso contínuo de medicamento retrovirais, de pessoa que não vivem com HIV e que tem o objetivo de evitar que a intersecção do vírus aconteça. Ela é indicada para pessoas que fazem parte de grupo de maior vulnerabilidade à infecção por HIV.
A gente entende hoje com a possibilidade do uso da PrEP que a existência de uma série de diferentes estratégias de prevenção e de diferentes contextos de vida, precisarão de diferentes estratégias de prevenção para manter-se livre dessa infecção. “O ideal seria que todas pessoas usassem camisinha, em todas relações sexuais, mas a gente sabe que isso não é possível. Então, se não se está utilizando camisinha em todas suas relações sexuais, saiba que pode ser uma pessoa que está vulnerável ao HIV e que talvez seja interessante uma estratégia adicional”, alerta o médico.
Preconceito: Sorofobia
O preconceito e a discriminação contra com o HIV e com as pessoas portadoras do vírus se chama sorofobia. Assim como racismo, LGBTfobia, a sorobia é extremamente institucional. Quando algo não se é dialogado, não se fala abertamente, como é caso da sorologia, a chance desse estigma se perdurar é ainda maior.
“Da mesma maneira que a gente tiver de ensinar essas pessoas a não serem homofóbicas, porque homofobia é um tipo completamente irracional de discriminação, a gente precisa ensinar as pessoas não serem sorofóbicas porque também uma forma irracional de discriminação”, diz Rico.
Para ele, a melhor forma de diluir os preconceitos é com conhecimento. “Quantas coisas sabemos hoje sobre o HIV: perfeitamente tratável, perfeitamente possível uma pessoa viver com saúde, mantendo sua vida do jeito que ela tinha planejado, tendo relação sexual, filhos, e tendo até relação sexual sem camisinha dentro do contexto de carga viral indetectável, ou com parceiros tomando PrEP, tem mil jeitos de você ter uma vida saudável”, complementa.
De acordo com o especialista, a pior coisa que uma pessoa soropositiva enfrenta hoje em 2020 não é a morte, a doença, o tratamento e sim o preconceito que elas sofrem diariamente. “As pessoas não tem mais medo de morrer por causa da HIV, as pessoas tem medo de que a sociedade, comunidade e amigos descubram que ela tem HIV, porque vão apontar, vão julgar ele, vão discriminar ele, como se ele tivesse feito alguma coisa que é reprovável”, diz.
“Todas as ferramentas que são necessárias para combater HIV já existem, a gente só precisa colocá-las em prática e ampliar elas”, finaliza.
Qual diferença entre AIDS e HIV?
Primeiramente para pontuar: São diferentes. Todos que têm AIDS, têm HIV. Mas, nem todo mundo que tem HIV, tem AIDS. A sigla AIDS em inglês significa Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Acquired Immunodeficiency Syndrome). Já a sigla HIV traduzida para o português quer dizer Vírus da Imunodeficiência Humana – da sigla em inglês.
O HIV é uma doença sexualmente transmissível (DST) e pode ser contraída no contato com sangue infectado ou de forma vertical, no caso de mulheres soropositivas grávidas.
HIV é o vírus causador da AIDS e ele ataca o sistema imunológico, responsável por defender o organismo de doenças. Mas ter HIV, não quer dizer que a pessoa também tenha AIDS. Para a pessoa ter AIDS é porque o sistema imunológico dela está sendo drasticamente afetado pela HIV.
Existem muitas pessoas soropositivas que vivem por anos sem apresentar sequer um sintoma e nem desenvolvem a doença. Mas, o precisar ficar alerta é que elas podem transmitir o vírus para outras pessoas através de relações sexuais sem proteção, pelo compartilhamento de seringas contaminadas ou de mãe para filho durante a gravidez e a amamentação, quando não tomam as devidas medidas de prevenção. Por isso é sempre muito importante realizar o teste.
Dados atualizados sobre HVI no mundo
ESTATÍSTICAS MUNDIAIS SOBRE O HIV EM 2019
De acordo com os dados mais atualizados levantado pela UNAIDS até o final de 2019, 25,4 milhões de pessoas tinham acesso à terapia antirretroviral, sendo que 38,0 milhões delas pessoas viviam com HIV em todo o mundo.
1,7 milhão de pessoas se infectaram por HIV e 690.000 de pessoas morreram por causa de enfermidades relacionadas à AIDS até o fim de de 2019.
Pessoas que vivem com HIV
– Em 2019, 38 milhões de pessoas viviam com HIV.
– 36,2 milhões de adultos.
– 1,8 milhão de crianças (até 14 anos).
– 81% de todas as pessoas que vivem com HIV conheciam seu estado sorológico positivo para o vírus.
– Cerca de 7,1 milhões de pessoas não sabiam que vivem com HIV.
– 25,4 milhões de pessoas tinham acesso à terapia antirretroviral, em comparação com os 6,4 milhões de
2009.
– 67% de todas as pessoas que vivem com HIV tinham acesso ao tratamento.
– 68% dos adultos maiores de 15 anos que vivem com HIV tinham acesso
ao tratamento, assim como 53% das crianças de até 14 anos.
– 73% de mulheres adultas maiores de 15 anos tinham acesso ao tratamento; contudo, apenas 61% dos homens adultos de 15 anos ou mais tinham acesso.
– 85% de mulheres grávidas que vivem com HIV tiveram acesso a medicamentos antirretrovirais para evitar a transmissão do HIV para seus filhos.
Novas infecções por HIV
Desde o pico alcançado em 1998, as novas infecções por HIV caíram 40%.
– Em 2019, foram registradas 1,7 milhão de novas infecções por HIV, em comparação com os 2,8 milhões em 1998.
Desde 2010, as novas infecções por HIV caíram cerca de 23%, de 2,1 milhões para 1,7 milhão em 2019.
– Desde 2010, as novas infecções por HIV em crianças caíram 52%, saindo de 310.000 em 2010 para 150.000 em 2019.
Mortes relacionadas à AIDS
– Desde o pico alcançado em 2004, os casos de mortes relacionadas à AIDS caíram mais de 60%.
– Em 2019, cerca de 690.000 pessoas morreram por causas relacionadas à AIDS em todo o mundo, frente aos 1,7 milhão de 2004 e aos 1,1 milhão de 2010.
– A mortalidade por AIDS caiu 39% desde 2010.
Investimentos
– Até o fim de 2019, havia 18,6 bilhões de dólares estadunidenses (em dólares constantes de 2016) disponíveis para a resposta à AIDS nos países de renda média e baixa, quase 1,3 bi a menos que em 2017.
– Cerca de 57% do total de recursos destinados ao HIV em países de baixa e média renda em 2019 vieram fontes domésticas.
– O UNAIDS estima que serão necessários 26,2 bilhões de dólares estadunidenses (em dólares constantes de 2016) para a resposta à AIDS em 2020.
Pronto, Ana Paula Valadão. Agora você já tem material suficiente (e não tem desculpas) para estudar e não repetir preconceitos aonde quer que você vá.
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Fonte