Precisamos entregar a Amaznia | EXAME - Ecoo

Precisamos entregar a Amaznia | EXAME

Nos debates sobre a Amaznia, h uma falsa oposio entre gerar riqueza com empregos e preservar a floresta. D para fazer as duas coisas, e bem, construindo uma economia baseada nos produtos da floresta. S precisamos vencer alguns obstculos. Um deles a dificuldade de logstica e comercializao. A regio , evidentemente, muito distante dos grandes centros de consumo e os transportes disponveis dificultam a vida de quem precisa deles. Dependendo da regio preciso usar vrios modais, entre balsa, barco, carro e caminho. E mesmo a infraestrutura j existente que foi planejada pensando no escoamento do agronegcio e das mineradoras no costuma ajudar os pequenos e mdios produtores, pois eles no tm recursos suficientes para acess-la.

Um exemplo disso so os portos: eles exigem grandes volumes de produtos para viabilizar uma operao, enquanto os empreendedores da sociobiodiversidade, em geral, produzem em pequena escala. So pessoas que tiram sua renda do uso sustentvel de produtos como cacau, caf, borracha, castanhas, cupuau, guaran, peixes, mel e farinha. O alto custo dos fretes praticamente inviabiliza o envio dessa produo para outras regies, situao agravada pela atuao nociva de atravessadores. urgente no s aproveitar melhor a infraestrutura j existente, como tambm criar novas, especializadas em pequena escala, com os diferenciais que ela exige.

Alm disso, ainda existem srios problemas de comunicao com reas mais remotas, o que contribui para que muitos produtores ainda atuem de forma individualizada, em vez de se fortalecerem em uma rede. Tambm h uma invisibilidade dessa cadeia produtiva. Pouca gente sabe de fato dos impactos positivos desse tipo de produo, como o de evitar o desmatamento e, ao mesmo tempo, preservar a biodiversidade e os saberes locais. Quem encontra na sustentabilidade uma renda no vai para o garimpo, no desmata e no cria gado em reas de preservao ambiental. E isso deveria criar mais valor para os produtos dessa regio.

Como viabilizar ferramentas que reduzam esses custos e aumentem a repartio dos benefcios para as comunidades, melhorando o escoamento de produtos locais na Amaznia? Uma das respostas pensar em solues em rede, conectando demandas e estratgias em larga escala. Nessa pegada, a Climate Ventures realizou, junto com a plataforma Parceiros Pela Amaznia (PPA) e o Instituto de Conservao e Desenvolvimento Sustentvel da Amaznia (Idesam), um laboratrio que reuniu 40 lderes, entre representantes de organizaes e empresas, empreendedores da regio e consultores de transporte e logstica, para pensar em sadas criativas e inovadoras para o problema: o Lab Amaznia.

Floriana Breyer facilitadora da Climate Ventures. O grupo comeou a se reunir no ano passado e j havia se reunido e planejado a articulao de um Centro de Distribuio em So Paulo, para ser um local que recebesse esses produtos e fortalecesse a rede de venda dos empreendedores que mantm a floresta em p. Essa ideia foi aprofundada e tambm faz parte dos cinco prottipos agora consolidados. Eles foram feitos a vrias mos e so muito complementares, quase parte de uma mesma estratgia de ao.

Esses projetos valorizam o mercado local, ampliam e reaproveitam as estruturas de frete j existentes, aglutinam plataformas e territrios e criam uma marca que fortalea a comercializao dos produtos amaznicos.Tudo isso aumenta as chances de sucesso dos empreendedores de negcios de impacto socioambiental e comunidades que usam bem a floresta.

Quais so esses projetos

Logstica e Otimizao de Fretes (Sociobiolog) O primeiro dos prottipos, que funciona quase como um guarda-chuvas para os outros, uma plataforma de logstica e otimizao de fretes dos produtos da sociobiodiversidade da Amaznia para os grandes centros de consumo. Baseada em parcerias com operadores logsticos, a proposta comear fazendo um mapeamento das rotas prioritrias e do volume de produo desses empreendedores, garantindo o acesso digital a essas informaes. A partir disso, a inteno buscar uma otimizao em parcerias com os empreendedores logsticos, vendendo para eles justamente o impacto desses produtos. Com um bloco negociando junto e demonstrando o valor agregado, a ideia reduzir pelo menos em 50% o custo de frete que os produtores da regio tm hoje.

Centro de Distribuio So Paulo (CDZO) O segundo prottipo, vinculado diretamente ao primeiro, o Centro de Distribuio de So Paulo, que quer otimizar custos e operao dos produtos da sociobiodiversidade para acessar o maior mercado consumidor do Brasil. J existe hoje no bairro Tatuap um espao de trs andares, destinado a produtos da economia solidria e a ideia juntar essa agenda com a da sociobiodiversidade. O espao fsico ser ento adaptado para que ele funcione como um Armazm Geral, categoria que permite vrias facilidades logsticas e algumas isenes fiscais. Alm disso, a inteno agregar nesses centro alguns servios de representatividade social, atravs do Conexo Solidria, parceiro que administra o local. A expectativa a de que o CDZO comece a operar j em 2020.

Plataforma Biob Essa uma plataforma de e-commerce, que conecta oferta de produtos da sociobiodiversidade com a demanda por eles. A Biob j existe como um projeto para os produtos do Cerrado e a est sendo melhorada e ampliada para contemplar tambm os produtos da Amaznia. A ideia funcionar como uma vitrine desses produtos, garantindo tambm a entrega deles.

Marca Amaznia Inspirado em marcas pas, com a Marca Peru ou Marca Buto, esse prottipo quer criar a primeira marca regio” do Brasil. A inteno fortalecer as pequenas marcas, com uma curadoria daquelas que j tm relevncia na Amaznia, aproximando os ativos da Amaznia Sustentvel e incluindo produtos da sociobio, dos consumidores dos grandes centros. Esse prottipo uma plataforma, mas tambm uma campanha. O foco divulgar tudo o que est por trs desses produtos no s para o Brasil, mas tambm para o mundo. Trata-se de um portal multimarcas que incentiva uma sociedade entre vrios empreendedores e o objetivo que esse comrcio evolua futuramente para loja em aeroportos.

Sinapse da Bioeconomia O ltimo dos prottipos uma chamada de empreendedores locais na Amaznia com o propsito de desenvolver solues para a Bioeconomia e fortalecer esse ecossistema na regio. Esse programa de acelerao, voltado especialmente para empreendedores em etapa inicial, est sendo liderado pela Fundao Certi (da Universidade Federal de Santa Catarina). A iniciativa focada na Amaznia pretende comear em Manaus, no Amazonas, onde j existe uma lei que obriga as empresas a investirem em tecnologia (por conta da Zona Franca). Em geral, os empresrios locais ainda no entendem que podem destinar essa verba para a bioeconomia da floresta, um potencial que esse prottipo quer aproveitar. O Sinapse quer incentivar os empreendedores a colocarem suas ideias em prtica oferecendo recursos financeiros principalmente atravs da articulao com as empresas da regio e capacitaes.

Uma caracterstica comum entre todos os prottipos que eles unem trs setores fundamentais para que funcionem na prtica: sociedade civil, empresas e governo. Essa diversidade de atores, incluindo tambm pessoas de fora da bolha, como tcnicos e consultores logsticos, talvez seja o ponto chave da mudana, ressalta Floriana Breyer. Segundo ela, todos esses projetos j esto consolidados e agora vo para a etapa de captao de recursos e impulsionamento. A inteno que no segundo semestre de 2020 eles j sejam implementados como pilotos. Depois eles devem ser avaliados e a sim atingir escala. O objetivo maior fortalecer o ecossistema de bioeconomia da Amaznia para que ela seja uma alternativa econmica realmente vivel. Os resultados sero divulgados assim que o processo de desenvolvimento avanar.

claro que essas iniciativas sozinhas no vo viabilizar a economia da floresta. Existem outros obstculos a serem resolvidos. Um deles a competio entre as atividades legais com a principal prtica criminosa da regio: o roubo de terras pblicas com desmatamento e pecuria para ocupar a terra de qualquer forma e tentar legalizar a invaso. A campanha Seja Legal com a Amaznia une representantes do setor privado e dos ambientalistas contra a grilagem por causa disso.A pecuria clandestina (em reas pblicas invadidas e/ou desmatadas ilegalmente) tambm inibe atividades econmicas que seguem a lei e preservam os recursos naturais.

Mas essas ideias do Lab Amaznia vo na direo certa. E mostram como compensa investir na infraestrutura que a regio precisa para se desenvolver, para alm de projetos mirabolantes baseados no modelo tradicional de explorao destrutiva do patrimnio natural.

*Com Anglica Queiroz

Fonte

Leave a Reply